sábado, maio 28, 2016

CADERNOS DE CULTURA - "MEDICINA NA BEIRA INTERIOR". (V)

O AMOR E A MORTE... NOS ANTIGOS REGISTOS PAROQUIAIS ALBICASTRENSES.
                                                               Por Manuel da Silva Castelo Branco

V - A derradeira «Aventura» de D. Pedro de Meneses/Amor proibido no paço dos comendadores.

(Continuação)
Assento 12 (S1 - 10, fl. 39) - Ao derradeiro dia do mês de Abril de 1624, mataram o senhor D. Pedro de Meneses, filho do senhor D. António de Meneses, comendador desta vila e seu alcaide-mor. Morreu duma espingardada na Costeira, ao fundo do chão que foi de Pero Gonçalves, donde dizem que lhe atiraram pela uma hora...
Deu a alma a Deus, foi confessado e ungido. Ao dia seguinte, o levaram a enterrar ao mosteiro de Santo António e, no dia seguinte depois do seu enterro, lhe disseram missa de presente e um oficio de 9 lições por sua alma os padres de Santo António e os de Nossa Senhora da Graça; e, ao outro dia, lhe fizeram os padres seculares (todos os que acharam presentes na terra) outro oficio e, por verdade, assinei/Frei Martim Dias Caldeira.
Assento 13 (Ibid., fl. 39v) - Ao derradeiro dia do mês de Abril de 1624, mataram Manuel de Matos e, segundo se disse, morreu de uma espingardada em companhia do senhor D. Pedro, cujo criado era. Foi confessado e ungido e morreu de morte apressada; não fez manda e jaz enterrado em Santo António.
Disse-se-lhe missa de presente ao dia seguinte e, por verdade, assinei. / Frei Martim Dias.
Comentário
Assim finalizaram tragicamente as aventuras «galantes» em que D. Pedro de Meneses se envolvera, quer com raparigas solteiras quer com mulheres casadas da vila, sem atender ao seu estado e condição social. D. Pedro, filho 2° de D. Constança de Távora e D. António de Meneses alcaide-mor e comendador de Santa Maria de Castelo Branco, vivera os primeiros anos na corte e, depois, andara embarcado nas Armadas, mas viera encontrar aqui o ambiente propício para satisfazer as suas inclinações «sentimentais» pelo sexo oposto...
Adicionar legenda
Com efeito, D. Pedro era ainda novo, usava o mesmo nome de seu 5° avô, o célebre conde de Viana e Vila Real (1° Capitão de Ceuta no reinado de D. João I) e, a princípio, muitos desculpavam-lhe os caprichos, sentindo-se honrados com a sua convivência ou gratos pela generosidade que demonstrava. Em breve, porém, começaram a tornar-se notórias e mal vistas algumas das suas aventuras amorosas, em especial as que houvera com D. Ana de Lucena e D. Ana de Almeida.
A primeira pertencia a uma numerosa família de cristãos - novos, sendo casada com Duarte Rodrigues também da mesma nação; na ausência deste e sem o consentimento dela, sua irmã D. Isabel de Lucena facultava a D. Pedro a entrada da casa, favorecendo assim os seus «ilícitos e desonestos amores»... (15) A segunda era irmã de Simão da Silva de Almeida e ambos filhos do doutor João de Almeida, desembargador da Casa da Suplicação, que servira de provedor da Misericórdia (1615-1616) e juiz de fora de Castelo Branco; D. Pedro «conversava» com ela aproveitando a complacência do boticário Manuel Jordão e de sua mulher D. Maria Lopes, por cuja residência penetrava na contígua do pai de D. Ana «tirando umas tábuas do sobrado»... (16)
De tudo isto resultaram discórdias e ódios mortais, pelo que o desembargador Francisco Borges de Faria veio a Castelo Branco tirar devassa, em 1622, com o fim de pôr cobro a tão melindrosa e degradante situação; e, no ano seguinte, D. Pedro e D. Fernando de Meneses (seu irmão mais velho) recebem ordem para regressar à corte.
E, então, sucede o inacreditável!... A vila divide-se em dois partidos: de um lado, os que consideram benéfica e indispensável a saída dos dois fidalgos, pois sentiam-se vexados com as suas liberdades e prepotências; do outro, os que lhe são favoráveis. Estes últimos acabam por dominar a situação, levando a própria Câmara a fazer uma representação a Filipe III, datada de 7.5.1623, manifestando-se contrária à retirada de D. Fernando e D. Pedro de Meneses «fidalgos tão ilustres e de tanta consideração e importância, pois eram amparo e refúgio de todas as necessidades da gente pobre e miserável com as sua pessoas e rendas, despendendo-as com tanta caridade e liberalidade e fazendo amizade e concórdia em proveito comum do povo» e, igualmente, opondo-se à devassa dos dois irmãos por tal medida resultar da inimizade que lhes tinham o juiz de fora da vila e dois homens dela (Diogo Pais Freire e Simão da Silva de Almeida) e mais gente «apaixonada por questões e delitos que se poderiam castigar e remediar por outras vias»... (17)
Efetivamente, o juiz de fora não subscreve este documento, nem as pessoas indicadas e outras mais, mas o certo é que os dois fidalgos permanecem na vila.
Entretanto, D. Pedro mete-se em nova aventura, pois enamora-se de D. Maria de Mendonça filha de Antão da Fonseca Leitão, fidalgo da Casa Real e senhor do grande morgado de Oledo, o qual assistia havia alguns anos com a sua família na velha urbe albicastrense. Segundo vários autores, D. Pedro teria desonrado a jovem com promessas de casamento; outros referem que, andando a requestá-la, seus parentes o advertiram para «cessar nos amores e se queria casar com ela a pedisse ao pai»... (18)  Em qualquer caso, a atitude de D. Pedro foi de afrontamento e esquiva pelo que, ferida na honra, a orgulhosa família do Fonseca Leitão decidiu vingar-se e terminar de vez com a causa da sua vergonha. Assim, na noite de 30.4.1624, um grupo de vários homens chefiados por Manuel da Fonseca Leitão (irmão de D. Ana) emboscou-se junto aos muros do castelo, defronte da porta da Traição e, quando D. Pedro de Meneses cavalgava pelo caminho da Costeira, de regresso à Alcáçova, acompanhado por Bernardo da Silva Castelo Branco e Manuel de Matos (seu criado), atiraram sobre eles... para matar!...  Era uma hora da madrugada... Apanhados de surpresa e antes de poderem ripostar, D. Pedro e Manuel de Matos foram atingidos cada um por 5 balas e Bernardo da Silva ficou com os três dedos principais da mão esquerda esfacelados.
Alertados pelo tiroteio e gritaria, acorreram criados e alguns soldados da guarnição, que transportaram os feridos para o Paço da Alcáçova. 
Ali faleciam, no mesmo dia e depois de confessados e receberem a extrema-unção, tanto D. Pedro como o seu criado. Quanto a Bernardo da Silva sobreviveu aos ferimentos, permanecendo no castelo durante algum tempo sob os cuidados do médico e cirurgião Dr. Francisco de Luna (irmão do célebre Dr. Filipe Montalto).
(Continua)
                                               O Albicastrense

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