A NOSSA HISTÓRIA
No alfoz da cidade de Castelo Branco, a uma distância de
três quilómetros para o lado do nascente, está situada entre olivedos, numa
colina aprazível, a ermida de Nossa Senhora de Mércoles cuja fundação é
tradicionalmente considerada obra dos Templários.
Frei Joaquim de Santa Maria, no Santuário Mariano,
atribuiu aos espanhóis, que antigamente afluíam à ermida em grande número, a
designação de “Nuestra
Señora de Miércoles” porque, segundo a tradição, apareceu ali a
imagem da Virgem Santa numa quarta-feira.
De uma só nave quadrangular com uma capela absidal
reentrante, é esta ermida um curioso exemplar, do período de transição do
estilo românico para o gótico. O portal da
entrada principal, construído no século XIII, é ornamentado com arcaturas em
ogivas sobrepostas em colunelos cujos capitéis são decorados com plantas
estilizadas. Os ábacos são prolongados para
receberem os colunelos onde apoia a cornija do frontão cujo remate é uma cruz
de secção circular. Possui a ermida mais dois
portais laterais em ogivas e o seu pavimento está num plano inferior ao do
terreno adjacente, sendo de cinco degraus essa diferença de nível. A abside,
construída de silharia, tem uma cobertura de três vertentes com cornija sobre
modilhões moldurados e é interiormente separada da nave por um arco de volta
abatida apoiado sobre pilastras.
Nos anos de 1609 e de 1857 – Datas gravadas no arco da
capela absidal – foram perpetradas na graciosa ermida varias transformações e
mutilações que lhe alteraram a primitiva traça românica. Na primeira daquelas
datas foram as paredes interiores revestidas de azulejos brancos intercalados
com duplas tiras azuis de azulejos cruzados em diagonal e, na segunda data,
sendo juiz da Confraria o 2º Visconde se Oleiros Francisco Rebelo, foi
substituído o primitivo tecto da madeira da nave que era primorosamente pintado,
construíram-se dois torreões na fachada principal e efetuou-se o arranjo do
adro.
No século XVI foi fundado junto da ermida um
conventinho para seis religiosas, por testamento de Rodrigo Rebelo, esforçado
cavaleiro que exerceu na Índia o cargo de 1º capitão de Côa, para o qual
nomeado pelo vice-rei Afonso de Albuquerque, tendo sido morto às lançadas pelos
indígenas, num combate que foi pormenorizadamente descrito por Damião de Góis
na Crónica do Felicíssimo Rei D. Emanuel.
Frei Manuel da Encarnação, do mosteiro da
Graça, refere-se à fundação do conventinho da Nossa Senhora de Mércoles numa
carta, datada naquele mosteiro em 18 de Junho de 1784, que dirigiu ao seu amigo
e condiscípulo António de Azevedo Velho Galache, com o objectivo de esclarecer
esse descendente de Rodrigo Rebelo de que não tinha qualquer direito a
reivindicar no convento Graça, cuja a igreja também havia sido fundada, com os
bens do mesmo testador, pelos seus herdeiros. Narra essa carta, que
foi arquivada na Câmara Eclesiástica, que Rodrigo Rebelo legou os seus bens a
sua irmã Maria Rebelo para que ela mandasse erigir em Mércoles e sustentasse
com os rendimentos daqueles bens um pequeno convento para seis religiosas.
Em vez de cumprir as disposições do testamento, dotou a herdeiro um filho e duas filhas com a totalidade dos bens herdados, mas, decorridos algum Tempo, passou a ter uma existência amargurada pelos reparos e pelas recriminações dos seus confessores.
Em vez de cumprir as disposições do testamento, dotou a herdeiro um filho e duas filhas com a totalidade dos bens herdados, mas, decorridos algum Tempo, passou a ter uma existência amargurada pelos reparos e pelas recriminações dos seus confessores.
Foi
então aconselhada, pelo seu genro Fernando Pina, a mandar construir seis celas
térreas em Mércoles e a albergar nelas seis frades capuchos que não viviam de
rendas por descriminação da respectiva ordem. Aceitou Maria Rebelo a sugestão de
seu genro mandando erigir as seis celas e promovendo a sua ocupação por outros
tantos frades capuchos.
Estes religiosos, porém, abandonaram o
conventinho logo que tiveram conhecimento de que o testador o havia dotado com
rendas que eles não podiam usufruir. O rei D. João III, ao ser informado de que
as disposições do testamento não haviam sido integralmente cumpridas, ordenou a
entrega do convento aos frades do mosteiro da Graça para que eles
reivindicassem as fazendas que haviam sido pertença de Rodrigo Rebelo, algumas
das quais passaram para a posse daquele mosteiro. Para alivio da sua
consciência, a herdeira Maria Rabelo fez ao convento da Graça algumas doações e
mandou erigir junto dele uma igreja, da qual existe ainda um portal manuelino
tendo ao lado uma legível inscrição em latim destinada a perpetuar o nome do
testador e dos seus herdeiros.
No Livro do Tombo da Comenda da Ordem de
Cristo foram inventariadas, em 1753, as seguintes casas anexas à ermida:
“Mais
lhe pertencem quatro casas que servem de se recolherem os romeiros, uma consta
de três salas de sobrado, a primeira com uma janela virada ao sul que tem de
comprimento quatro varas e um palmo e de largo duas varas e quatro palmos e as
outras duas tem a mesma medição e cada uma sua janela; junto das ditas casas
estão três casas térreas quase todas igual grandeza e todas têm portas por onde
comunicar”.
Não está bem averiguado se era
nestas quatro casas, utilizadas para residência do ermitão e recolha dos
romeiros, que se situavam as seis celas a que alude a carta de Frei Manuel da
Encarnação. O ermitão de Nossa Senhora de Mércoles era nomeado pela Câmara
Municipal desde tempos imemoriais, conforme consta da ata da sessão de 21 de
Novembro de 1790.
No adro da ermida existe um cruzeiro de
granito, de construção moderna, constituído por um fuste cilíndrico apoiado
sobre um plinto e rematado por uma cruz floreada assente sobre um anel que lhe
serve de base. O povo de Castelo Branco, nas estiagens muito prolongadas e
calamitosas, tem por hábito muito antigo conduzir em procissão a imagem de Nossa
Senhora de Mércoles para a Igreja da Sé e de fazer ali suas preces par que os
campos sejam beneficiados com a chuva.
Teve sempre, o povo da cidade e dos seus
subúrbios, uma grande veneração pela Nossa Senhora de Mércoles, dedicando-lhe
outrora varia romarias durante o ano, principalmente em todas sextas-feiras do
mês de Março.
A festividade mais importante
realizava-se no domingo de Bom Pastor e nos dois dias seguintes. Esta romagem
teve origem num voto que a Câmara Municipal de Castelo Branco fez em 2 de Julho
de 1601, em agradecimento à Nossa Senhora por ter livrado os habitantes da
peste que, naquele ano e noutros precedentes, grassara no pais.
Todas os vereadores e oficiais da Câmara
se incorporavam numa procissão que ia da povoação à ermida em cumprimento do
voto e todos os clérigos de Ordens sacras que estivessem presentes eram
obrigados a assistir, sob pena de excomunhão, por ordem do Bispo da Guarda D.
Nuno de Noronha.
PS. O texto é
apresentado nesta página, tal qual foi escrito na época.
Publicado no antigo jornal Beira Baixa, em 1951.
Publicado no antigo jornal Beira Baixa, em 1951.
Autor. M. Tavares dos Santos
O
ALBICASTRENSE
Excelente testo sobre a ermida de Nossa Sra de Mércules, mas no texto é feita esta referencia: "Frei Joaquim de Santa Maria, no Santuário Mariano, atribuiu aos espanhóis, que antigamente afluíam à ermida em grande número, a designação de “Nuestra Señora de Miércoles” porque, segundo a tradição, apareceu ali a imagem da Virgem Santa numa quarta-feira. " É sabido o motivo porque a romaria e consequente feriado municipal é celebrado à terça-feira e não à quarta-feira como o nome e o texto indica?
ResponderEliminarObrigado
Caro Carlos Alves.
ResponderEliminarConfesso que quando escrevi o texto também estranhei o facto, pois a celebração como diz e todos nós sabemos, é feita na terça-feira. Contudo o autor do texto diz nele, que a Virgem apareceu na quarta-feira. Das duas uma, ou o autor enganou-se no dia quando escreveu o texto, ou então anda-mos a celebrar o acontecimento em dia errado.
Abraço