sexta-feira, julho 17, 2009

EFEMÉRIDES MUNICIPAIS - XIX

A rubrica Efemérides Municipais foi publicada entre Janeiro de 1936 e Março de 1937, no jornal “A Era Nova”. Transitou para o Jornal “A Beira Baixa” em Abril de 1937, e ali foi publicada até Dezembro de 1940. A mudança de um para outro jornal deu-se derivada à extinção do primeiro. António Ribeiro Cardoso, “ARC” foi o autor desde belíssimo trabalho de investigação, que lhe deve ter tirado o sono, muitas e muitas vezes.
O texto está escrito, tal como foi escrito e publicado em 1937.
Os comentários do autor estão aqui na sua totalidade.
Comentário do autor: Os enjeitados por esse tempo eram numerosos. Filho que não pudesse ter pai no assento do baptismo ia parar á roda ou era deixado á primeira porta que se encontrava a jeito e os encargos da sua sustentação iam para cima da Câmara. Hoje, vamos lá, também uma vez ou outra ainda aparece um exposto aqui ou além, mas é caso raro. A polícia tem os olhos um pouco mais abertos, raro é que se apure quem é a mãe, embora se não consiga saber quem é o pai, o que raramente a mãe é capaz de dizer sem receio de se enganar.
Não era assim há século e meio por isso a despesa que se fazia com os enjeitados era grande, e ainda por cima a sua criação corria á matraca.
As amas pediam enjeitados tiravam-lhe os fatinhos que a Câmara lhes dava e vestiam-nos aos seus filhos legítimos ou ilegítimos, deixavam-nos morrer á fome e não participavam a morte para continuarem a receber as importâncias para a sustentação dos mesmos e os modestos vestidinhos com que se cobriam. Enfim, uma verdadeira lástima.
Para por termo a tão lamentável estado de coisas, a Câmara em sessão de 1 de Setembro de 1781, mandou fazer “ um livro novo de todos os enjeitados” para se saber á certa os que havia, mandou vigiar de perto as amas para, semana a semana, saber como os infelizes eram tratados e ordenou expressamente que, de três em três messes, as amas comparecessem com os enjeitados nos Paços do Concelho para poderem ser vistos pelo físico e apurar-se sem receio de erro se as “antigas enfiadeirias” de anjos cumpriam á risca os deveres que lhes eram impostos. Os abusos não acabaram de todo, é certo, mas a situação dos pobres enjeitados melhorou um pouco.
E amas de expostos conhecemos nós que se a afeiçoavam aos pobres enjeitadinhos como se seus filhos fossem e cuidavam deles com o maior carinho. Até conhecemos uma que, terminado o chamado período de criação que se estendia até aos sete anos, continuava a cuidar dos pobrezinhos, trabalhando de sol a sol e até noite fora parar os sustentar, mandava-os á escola para que aprendessem a ler e escrever e procurava arruma-los em condições de poderem ganhar a vida ”sem vergonha do mundo”, como ele dizia. E dalguns consegui fazer alguém. Eram exemplares raros, amas destas, mas ainda aparecia uma ou outra.
Em sessão de 16 de Fevereiro de 1782 a Câmara adoptou a seguinte deliberação:
Acta de 1782: E outrossim atendendo às queixas que fizerão os mesmos moradores dos prejuizos que lhe resulta de estarem colomeias nos coutos que destroem as novidades, e frutos das arvores, determinarão que em observância dos Acordos antigos desta Camara e em comservação dos frutos cuja expecção he própria da Camara, determinarão que as colomeias fossem expulças do Povo e coutos com pena de quinhentos reis.
Comentário do autor: Anda nesse tempo se tornavam as utilíssimas e inofensivas abelhas culpadas de estragos nas novidades e frutos das arvores e por isso as “colomeias” eram expulsas lá para as terras dos mouros, onde não houvesse pão nem vinho nem flor de rosmaninho… E esta determinação da Câmara era tão rigorosa que se impunha aos juízes do Povo a obrigação de “dar corridas aos coutos” e de “ dar parte a esta Câmara dos transgressores para serem condenados”.
Bem sabemos nós quem, se vivesse nesse tempo e visse as suas colmeias expulsas do local que amorosamente para elas escolheu, era capaz de correr a pau os juízes do povo ou de ter uma congestão cerebral como consequência do desespero que apanhava!
Deus há de ter perdoado aos vereadores o falso testemunho que levantaram às pobres abelhas, que nunca fizeram mal nenhum aos frutos, antes muito pelo contrário. A produção de cereais na nossa região tinha-se tornado escassa por vários motivos. A situação da lavoura era pouco menos do que desesperada. A Câmara entendeu que devia empregar todos os meios ao seu alcance para acudir a tão angustiosa situação e, em sessão de 20 de Abril de 1782, meteu ombros á empresa. Analisando as causa da decadência da lavoura, reconheceu que:
Acta de 1782: Hum dos princípios desta decadência das lavouras se tem reconhecido na falta de sementes no tempo das sementeiras; porque tendo sido os annos estéreis e de pouca produção, não colhe o lavrador para que chegue para sustentação e reservar para a semente, seguindo-se desta falta ou não semear o necessário ou ser precizado a tomar alguns alqueiros de pam nos seleyros dos rendeiros para pagar pello mais alto preço que correr no anno seguinte antes da colheita futura. Daqui resulta que para pagar hum alqueire se precizão três ou quatro porque a experiencia tem feito manifestas muitas fraudes para lhe aumentar o preço. E não vem o lavrador a colher para pagar o empréstimo vindo a perder o serviço de hum anno e a ter de pagar de suas casas a renda das terras que tomou para cultivar.
Comentário do autor: E tendo aqui a causa do mal, ou pelo menos uma das causas, que havia de fazer a Câmara? Pensou e achou
Acta de 1782: Para ocorre a este prejuízo tem destinado a estabelecer um celeyro comum ou monte da piedade sujeito á ademenistração desta Camara para dele emprestar aos lavradores as sementes necessárias e recebellas ao depois na messma espessia sem enteresse ou avença mais do que aquele que for indispensável para suprir as quebras pois que sem ele não poderia concervarce petuamente o seleyro em beneficio dos mesmos lavradores. Para o seu estabelecimento tem destinado aplicar alguas proçoeus do dinheiro dos Povos que sendo sugeytos verdadeiramente à ademenistração deste Senado que tem a sua intenção fundada no Governo das rendas publicas, elle tem a satisfação de ver que o Meretissimo Doutor Provedor actual o Doutor João de Figueiredo, tem feito mais incontrorveça esta admenistração nos muitos doutos provimentos que acaba de dar nos livros das contas dos mesmos Povos.
Comentário do autor: Assente a criação do celeiro comum ou monte de piadade dos lavradores, era preciso não perder tempo, porque a situação da lavoura era daquelas a que de acode logo ou está tudo perdido. E acudiu-se realmente, como vai ver-se
(Continua)
Ps – Mais uma vez informe os leitores dos postes, “Efemérides Municipais” que o que acabou de ler é uma transcrição fiel do que saiu em 1937.
Modificar, emendar ou alterar estes artigos seria na minha perspectiva um insulto ao seu autor.
O Albicastrense

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