ASSISTÊNCIA AOS
DOENTES, EM CASTELO BRANCO
E SEU TERMO, ENTRE OS COMEÇOS
DOS
SÉCULOS XVII E XIX.
Manuel
da Silva Castelo Branco
O
presente estudo constitui o prosseguimento de um outro, elaborado
para as I Jornadas de História da Medicina na Beira Interior (1989),
onde tratei do tema em epígrafe até princípios de seiscentos.
Neste
trabalho segui as linhas gerais estabelecidas então para o primeiro,
procurando apresentar igualmente por forma sumária as diversas
matérias, resultantes
de uma investigação aliciante mas complexa e morosa...
I
PARTE
No
largo período a que nos vamos reportar, continuam a funcionar em
Castelo Branco e no seu termo - Alcains, Benquerenças, Cafede,
Cebolais, Escalos de Cima e de Baixo, Juncal, Lentiscais, Lousa,
Malpica, Mata, Maxiais, Monforte, Palvarinho, Retaxo e Salgueiro -
algumas das instituições já referidas anteriormente e, embora
surjam outras iniciativas, torna-se notório o desenvolvimento das
Misericórdias no decurso destes 200 anos..
O
HOSPITAL DOS CONVALESCENTES
Com
o objectivo de receber os convalescentes de ambos os sexos,
provenientes do hospital da Misericórdia, foi instalado pelo Padre
Dr. Bartolomeu da Costa nas casas de residência, que possuía na rua
d’ Ega, ali se conservando depois da sua morte em Lisboa, a
27-3-1608. Para
o efeito este grande benemérito deixou todos os haveres à
Misericórdia de Castelo Branco, por testamento lavrado naquela
cidade, a 30-4-1605.
Os seus bens constavam de duas casas, 2 vinhas,
6 olivais, 9 terras de cultura e um padrão de juro com o rendimento
anual de 240000 réis. O Padre Bartolomeu da Costa, que nasceu em
Castelo Branco a 24.08.1553, doutorou-se em Teologia na Universidade
de Coimbra e foi tesoureiro-mor e cónego da Sé de Lisboa.
Pelas
suas virtudes e extraordinária acção caritativa, a Igreja
concedeu-lhe o título de Venerável e o Povo apelidou-o de
Tesoureiro Santo. Daí,
a designação por que ficou também conhecido o Hospital dos
Convalescentes, anexo ao da Misericórdia, sob cuja administração
sofreu igualmente diversas obras de restauro.
O
HOSPITAL DAS MULHERES
Com
este nome aparece registado no novo “Tombo
das capelas da igreja de S. Miguel, matriz de Castelo Branco”,
a propósito do falecimento, em 10.03.1764,
de Frei
Martinho Gomes Aires, vigário do Colegiado de Santa Maria e morador
na freguesia de S. Miguel, “nas
suas casas próprias que foram dos Samúdíos, na rua d’Ega,
defronte do Hospital das Mulheres”...
Nada
mais apurei sobre este hospital que, presumo, pertenceria também à
Misericórdia, achando-se próximo dela, na Rua d’Ega, talvez com o
propósito de substituir temporariamente qualquer dos outros, em
obras de beneficiação. Podemos ainda supor, tratar-se do próprio
Hospital dos Convalescentes, situado naquela artéria e assim
designado por engano ou por outra razão...
A
ENFERMARIA PARA PASSAGEIROS, NA ERMIDA DO ESPÍRITO SANTO
Como
já vimos, consistia numa casa anexa à capela-mor da ermida, com a
qual comunicava por meio de uma porta sita do lado do Evangelho e
medindo 12 palmos de alto e 9 de largo.
A
enfermaria tinha 35 palmos de comprido, 23 de largo e 15 de alto,
sendo de telha-vã. Ainda existia em 1706 (mas
já sem serventia há bastantes anos)
quando o Dr. Francisco Xavier da Serra Craesbeek, juiz de fora da
vila, procedeu à execução do “Tombo,
medição e demarcação de toda a fazenda, propriedade e foros da
comenda de Santa Maria do Castelo da notável vila de Castelo Branco”
de que era comendador o Infante D. Francisco.
A
CAPELA, ALBERGARIA É HOSPITAL DE SANTA EULÁLIA
Situava-se
na Rua dos Ferreiros, entre a porta da Vila e Postiguinho dos
Valadares, do lado direito de quem ia para a Corredoura, convento da
Graça e Paço do Bispo.
A
capela tinha toda a frontaria em pedra de cantaria lavrada e um
campanário com o seu sino; a portada, virada ao Poente, dava para a
rua pública; no altar oposto à entrada principal, estava o retábulo
e nele, um crucifixo de marfim e as imagens de Nossa Senhora da
Conceição e de Santa Eulália. Aos lados do altar abriam-se duas
portas: a da esquerda para a sacristia e, a da direita, para a
albergaria e hospedagem dos passageiros.
Esta
última sala, com 4 varas e 3 quartas de comprimento e 3,5 de
largura, tinha mais duas portas e nela havia uma chaminé e quatro
camas para os viandantes pobres e peregrinos, que ali se poderiam
recolher e agasalhar durante três dias...
Assim
vai descrita esta casa, embora mais detalhadamente, a 26.02.1770 no
“Tombo
do Morgado de Santa Eulália”,
efectuado então sobre a direcção do Dr. José Inácio de Mendonça,
corregedor e ouvidor da Comarca de Castelo Branco, cavaleiro da Ordem
de Cristo e do desembargo de Sua Majestade.
A
BOTICA DO PAÇO DO BISPO
Após
a construção do seu paço, no extremo Norte da Corredoura, em
1596-98, os Prelados da Guarda (a
cuja diocese pertencia a vila de Castelo Branco)
ali passaram a residir com frequência, não só por virtude das
costumadas visitas pastorais mas também para fugir aos rigorosos
Invernos da sede do bispado.
A
eles se deve a primeira fase de valorização daquele edifício, quer
no arranjo de vários anexos, quer no enriquecimento do seu recheio
(móveis, livros,
vestimentas, quadros, utensílios de cozinha, etc, etc.).
Em
1771, D. José I desmembra da vasta diocese da Guarda o novo bispado
de Castelo Branco e eleva esta vila a cidade. Assim surge a segunda
fase no
desenvolvimento
do Paço Episcopal, com a sua ampliação e embelezamento,
tornando-se sem dúvida o edifício de maior envergadura da região.
Entre a ilustre série dos prelados da Guarda, destaca-se a figura de
D. João de Mendonça (1711-1736), o fundador do famoso Jardim do
Paço, distinto numismata e bibliófilo, ao qual se deve também o
estabelecimento de uma preciosa botica.
Para
cuidar dela contratou o boticário João Rodrigues Curado, ao qual
legaria (por sua
morte) a quantia
de 40.000 réis.
Ora
a botica, bem fornecida e qualificada, era utilizada não só nos
serviços internos, mas posta com toda a liberalidade à disposição
dos necessitados. E esse costume manteve-se enquanto ela existiu..
O
RECOLHIMENTO DAS CONVERTIDAS OU CONSERVATÓRIO DE
SANTA MARIA MADALENA
Mandado
construir, em 1715 na Rua do Cavaleiro, pelo Bispo D. João de
Mendonça (que
encomendara o respectivo projecto ao cap. Eng° Valentim da Costa
Castelo Branco),
seria concluído mais tarde no tempo do seu sucessor D. Bernardo
António de Melo Osório (1742-1771). A
inauguração oficial deu-se a 14.02.1753, com uma procissão solene
tendo à frente o prelado, mas só a 25 de Março começaria a
funcionar, ao entrar a primeira regente, a porteira e três
recolhidas. Inicialmente, o Conservatório destinava-se a recolher
“mulheres
que por seu desamparo estavam em risco de ruína conservando-se em
liberdade e aonde ao mesmo tempo se empregassem no culto e louvor a
Deus”. Em
1769, admitiam-se 3 categorias de recolhidas: gratuitas “escolhidas
entre as mais pobres do bispado e que prometessem maior progresso em
virtude”,
que recebiam diariamente 40 réis; porcionistas, que pagavam
anualmente 30.000 réis; e seculares, as que entravam “sem
ânimo depermanência”.
Nos
estatutos especificavam-se, entre outros, os ordenados ao médico da
casa (6.000 réis) e ao sangrador (3.000 réis). O último bispo de
Castelo Branco, D. Joaquim José de Miranda Coutinho, conseguiu
transformar um pouco os hábitos das recolhidas, criando nele uma
escola do sexo feminino, por elas regido e com o fim de lhes ocupar o
tempo. Porém, após o seu falecimento, tudo voltou ao antigo e o
Recolhimento entrou em franca decadência... No seu edifício seria
instalado o Asilo Distrital da Infância Desvalida (1867).
NOTA:
Aos
responsáveis pela edição dos cadernos relativos às Jornadas
de História da Medicina na Beira Interior, este albicastrense só
pode mesmo dizer-lhes,
que não desmereçam perante as muitas dificuldades.
Desejando
ainda, que nos brindem com estes cadernos por muitos e muitos mais
anos.
PS.
Para quem se interessar por este tipo de leitura, só tem que
clicar em: www.historiadamedicina.ubi.pt/cadernos.html.
O
Albicastrense
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