PROCISSÃO DO CORPO DE DEUS
NA TERRA ALBICASTRENSE (SÉCULO XVII).
A entrada do exército inimigo em Castelo Branco,
implantando a dor e a tristeza na sua população, realizou-se no dia do Corpo de
Deus, precisamente na data em que ela saia organizar uma faustosa e brilhante
procissão espaventosa e pitorescas folias.
Para se avaliar a importância e brilho dessas festas, aqui se transcreve um
curioso programa elaborado pela Câmara de Castelo Branco. Rol dos juízes
de ofício que ande dar danças e insígnias e tudo o mais necessário para a
procissão do Corpo de Deus ano de 1680.
“Francisco
Esteves, juiz dos pastores, dará uma dança de paus de seis homens que é a da
Lousa. Os cabreiros darão outra dança”.
“Manuel
Francisco, juiz dos hortelões, um carro armado de flores e frutas”.
“Simão
Fernandes, juiz dos alfaiates, a Serpe bem vestida com quatro homens de guarda
com suas chuças e sairá na véspera do dia e correrá a Vila”.
“Francisco
Marques, juiz dos cardadores e tosadores dará S. Gens em sua charola
acompanhado de duas tochas adiante e uma dança”.
“António
Pires, juiz dos sombreiros dará uma dança mourisca com sua insígnia adiante que
lavará um sombreiro”.
“Tomás
Rodrigues, juiz dos ferreiros, dará quatro diabos e sua insígnia”.
“Paulo
Rodrigues, juiz dos tecelões e tecedeiras, dará Santo Estêvão em sua charola e
uma dança adiante com seu folião e a dança será de seis moças”.
“Carlos
Ribeiro, juiz dos carpinteiros, dará S. José em sua charola e duas tochas e uma
dança”.
“Manuel
Gomes, genro de João Bonito, juiz dos sapateiros dará S. Crispim em sua charola
com duas tochas e uma dança adiante e três moças com violas e castanhetas”.
“André
Francisco, juiz dos moleiros desta vila e termo dará Santo António em sua
charola e duas tochas e uma dança de seis homens ou moças com seu folião”.
“Mateus
Travasses, juiz dos almocreves, dará Santo Amaro em sua charola com quatro
tochas e seu guião e uma dança”.
“Domingos
Fernandes Grilo, juiz dos barbeiros, dará o Rei David com ceptro e coroa muito
bem vestido e dois pajens que o acompanhem”.
“António
Martins Calrão, juiz dos cadeireiros, dará um guião com descantes de três
violas de bons tangedores”.
“Lucas
Fernandes, juiz dos ferradores, dará S. Jorge em seu cavalo com dois
estribeiros de cada lado à turquesca.
“
Francisco Travassos, juiz dos estalajadeiros, dará oito homens de alabardas em
corpo com couras, ou vestidos de armas brancas com tambor adiante de S. Jorge e
um pífano.
“Bartolomeu
Rodrigues, juiz dos espingardeiros e serralheiros dará um homem com insígnia se
alferes, com a sua banda, que irá a cavalo diante dos soldados de S. Jorge, por
pajem da lança.
“Marcos
Fernandes, juiz dos oleiros, dará um rei mouro com coroa e ceptro, com quatro
mouros a seu lado com seus alfanges, que irão a traz de S. Jorge. “Manuel
Sanches, juiz dos pedreiros, dará um estandarte ou bandeira de guerra e um
tambor que irá adiante dos soldados de S. Jorge.
“Gaspar
da Fonseca, juiz dos cereeiros dará oito tochas para acompanhar o Santíssimo.
“Os
mercadores cada um dará uma tocha que eles levarão ou mandarão ter na
procissão.
“Catarina
Martins Ferreira, juíza das padeiras, dará duas pelas e um dança de seis
mulheres com pandeiros e castanhetas com seu folião.
“Os
boticários cada um levara sua tocha entre os mercadores.
“Manuel
Martins Galeguinhos, juiz dos maquilões dará uma dança pastoril (Designavam-se
maquilões os homens que transportavam os cereais para os moinhos e a farinha
para a casa dos clientes dos moleiros).
“O
alferes de S. Marcos irá com seu guião.
“Baltazar
Gonçalves, juiz dos mulateiros e burriqueiros dará uma dança mourisca de oito
homens.
“Os
obrigados e magarefes dos açougues levarão, uma hora antes da procissão sair,
um touro amarrado à corda pelas ruas por onde for a procissão, com homens que
levem suas aguilhadas para tagerem o touro e, na corda a que for amarrada, irão
pegando nas pontas uns a traz e outros adiante do boi”.
A
festa principiava na véspera, em que os juízes de ofício tinham de ir
à Câmara mostrar as suas danças e folias, sendo multado ou preso aquele
que não cumprisse.
Nesse dia eram
permitidas todas as folganças e turânicas sendo os diabos (pobres aprendizes de
ferreiro pintados de preto e de vermelho) apedrejados pelos gaiatos entre
chufas a risotas.
Porém, no dia da
procissão, não eram permitidos os motejos da véspera e o cortejo fazia-se com a
circunspeção das autoridades e a compostura de todas os figurantes, sob a vigilância
atenta dos meirinhos e beleguins.
Ps. O texto é da autoria de Manuel Tavares dos Santos está escrito tal
como foi publicado pelo seu autor, no jornal Beira Baixa em 1951
O ALBICASTRENSE
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