sexta-feira, julho 25, 2025

EXÊNTRICOS DA TERRA ALBICASTRENSE


MEMÓRIAS DA TERRA ALBICASTRENSE

Do  livro, "A Propósito da Monografia  de Castelo Branco", da autoria de José Germano da Cunha (1891), retirei o texto que podem ler a seguir. 
Confesso que adorei o texto e que muito adoraria eu, ter conhecido este excêntrico albicastrense do passado.  

ALEXANDRE ANTÓNIO PEDROSO

O CELEBRE MORGADO DA ALEGRIA”

Falecido em Castelo Branco em 1850. Este homem dotado de prestigiosa força muscular pegava em dois bons sacos de sementes, um em cada mão, e subia uma escada com a maior agilidade. Contudo, e este desenvolvimento físico não correspondia o intelectual. Possui-a abastada fortuna, e isto provavelmente fez com que o dispensassem do incomodo de estudar, como as vezes acontece. Pertencia as famílias ilustres do Condo Redondo e Marques das Minas.
Cercado de mimos na sua infância, e deste então acostumado a viver fora do seu seculo, conservou sempre várias tradições e hábitos fidalgos da corte na idade media, a par das mais ridículas superstições. 
Vestia sempre de seda, ou de veludo, trajava ele casaca, colete de grandes abas, recamado de luzentes lentejoulas, calção e meias, sapatos de fivelas, chapéu armado, bastão de marfim tao alto como ele, que o era bastante.
Uma figura. E por este modo se apresentava em toda a parte. Livre de preconceitos, arreceando-se muita das mulheres, tinha verdadeiro horror as bruxarias, feitiços e mãos olhados. Por isso esse extraordinário excêntrico ia, a altas horas de noite, todo diplomático de bilha na mão, buscar água ao chafariz para que lha não enfeitiçassem. Conta-se também que serviçais seus, depois de fazerem oscilar fortemente os presuntos que pendiam do teto, o chamavam para ele ver que os mesmos presuntos estavam embruxados e os mandar imediatamente por fora de casa, o que solicitamente se cumpria sem demora. E o mesmo destino tinham muitos outros objetos acometidos de igual doença.
Sempre alheio a todo o movimento progressista da sociedade, este notável, atravessava as ruas da cidade sem ser perseguido pelos apupos da rapaziada como figura carnavalesca. Caminhava altivo e sobranceiro, como uma tradição viva, uma relíquia respeitável, legada pelas nobres gerações extintas no século das grandes transformações em todos os ramos da atividade humana. 
Este homem podia ter visto o Marquês de Pombal em todo o esplendor da sua omnipotência e mais tarde ao seu desterro. Podia ter aos 14 anos, assistido á tomada da Bastilha e depois à decapitação de Luís 16º e de Maria Antonieta, a todo esse caos da revolução francesa, donde saiu a luz da liberdade e de emancipação e a quantos sucessos se seguiram extraordinários e demolidores do antigo regime, os quais presenciou na parte respeitante ao nosso país. E ele. de pé entre os seus amarelados pergaminhos, como estatua de bronze levantada em seu pedestal, apontava para o passado, dizendo-lhes: “Sou teu”.
E firme e intemerato viu desabafar em redor de si instituições, crenças, costumes e quanto pertencia a uma civilização condenada ao ostracismo. Sobre esses escombros ergueram-se as sociedades modernas tao diversa, tão outras. E ele, representante do retrocesso, conservou-se sempre fiel às tradições e preconceito de raça, no seu posto, como protesto vivo, talvez inconsciente, contra a invasão das novas ideias, que proclamavam os direitos do homem. Não se insurgiu, empregando meios violentes, ou mesmo diatribes aceradas.
A sua individualidade própria era o protesto mudo e singelo; o modo de se apresentar, a riqueza exótica do seu traje, o seu carácter cavalheiroso e inofensivo, tudo isto lhe atraia o respeito e a consideração publica, e fez com que atravessasse incólume as épocas calamitosas, que afligiram Portugal. Não podia deixar de despertar os sorrisos escarnecedores e muitos dos que o viam; porem, não se passava disto. 
Não era um doido, ou um idiota; era simplesmente um excêntrico, cuja memória eu respeito, porque encontro nesse vulto original, único talvez em toda a península que quer seja de sublime e épico. Não longe das suas 80 primaveras, fez a maior das tolices. Casou? Perguntará o leitor. Não senhor; nessa não caiu ele; já aqui se disse que tinha um medo supersticioso das mulheres. A tolice, que fez, foi deixar-se morrer. Há quem diga que o mandaram para cova de patinho e capela.
PS. O texto está escrito tal como José Germano o escreveu 1891.
O ALBICASTRENSE

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