terça-feira, setembro 09, 2014

A TERRA ALBICASTRENSE

FACTOS E ALBICASTRENSES
De
OUTROS TEMPOS
Nos velhos jornais da terra albicastrense, tenho encontrado artigos que são autênticas pérolas. A jóia que aqui quero destacar desta vez, é uma carta enviada ao director do jornal reconquista em 1951, por José Roxo.
Nessa carta, José Roxo narra a sua visita a Castelo Branco, após vinte anos de ausência. Curiosamente, José Roxo fala na sua carta, de um antepassado meu com grande carinho e ternura (tio avô), situação que me deixou com um grande sorriso no rosto. 
 Todavia, o que me levou a postar o referido artigo neste blog, é a história da sua vista à terra albicastrense, após 21 anos de ausência. Narrativa, onde ele fala das bichas de cântaros no chafariz na Mina, Granja e Cansado, da Carreirinha, da capela de S. Jorge, do miradouro, da travessa da alegria e de muitas outras coisas novas, que a terra albicastrense viu nascer nos anos em que ele esteve ausente. 
O artigo é sem qualquer duvida, uma verdadeira lição de história desse tempo para os albicastrenses de hoje, aula, onde ele fala de locais e de pessoas que muito contribuíram para o desenvolvimento da terra albicastrense. A postagem deste artigo, é pois, uma pequena homenagem deste albicastrense, a outro albicastrense que muito deve ter amado a sua terra.
VINTE ANOS DEPOIS
(17 – 04 - 1951)
Castelo Branco tem progredido muito nos últimos vinte anos, talvez mais que qualquer outra cidade de província. Comprovam-no todos os que por aqui passam, naturais ou estranhos, depois de alguns anos de ausência .
José Roxo, albicastrense que muito ama a sua terra, sentiu-o vivamente, quando à dias a visitou, e bem o mostra na franqueza que transparece na carta que após a sua visita, nos enviou e que hoje começamos a publicar:
Pelo ano de 1931, sai de Castelo Branco – minha terra natal – com destino a longínquas paragens. Era novo ainda - menos de 20 anos – e levava na alma a ânsia de vencer. Comigo foi toda a fortuna que possuía: pai e mãe. Na terra ficaram-me apenas saudades e um pequeno punhado de amigos, entre eles o meu já velho patrão, Joaquim Martins Bispo. Ao serviço dele havia passado alguns anos da minha infância e tinha-lhe amor e respeito.
Alto, seco, já calvo, barba grisalha, olhar franco e voz forte, era um tipo perfeito de homem que sabe o que quer e para onde vai. Isto é: infundido respeito, impunha-se à simpatia. Sempre sereno e calmo, em todos os actos da sua vida lhe apreciei uma honestidade perfeita, uma consciência sã e uma vontade firme, cativante e atraente. Assim, em cada cliente tinha um amigo, e seus colaboradores encontravam nele um bom conselheiro. Parti em busca de novos horizontes e nunca mais o vi. Os anos passaram, uns após os outros, e duas décadas se completaram em 1951, sem que tivesse oportunidade de voltar ao ponto de partida.
Falando de Castelo Branco, inclui-o sempre, no número das minhas recordações, mas, um dia, fui informado de que havia morrido. Isto não me surpreendeu, porque, quando o vi pela ultima vez era tal como o descrevi. Nunca mais falei dele. A cidade havia aumentado, diziam-me. Eu senti desejo de, ao menos uma vez, voltar ao berço natal e, no dia 8 do corrente, eis-me a caminho para a minha “velha terra”.
Eram 4 horas de tarde quando cheguei, rodeado dos meus, pois tinha fundado um lar há muito. Sem filhos é certo, mas criei encargos, com os quais me considero
protector de uma grande família. DEUS abençoa o meu casal, observo-o cheio de graças e vivo contente, rodeado de velhos e crianças a quem o meu braço faz felizes. A cidade de há 20 anos antes tinha sofrido uma verdadeira revolução!
O progresso, aguilhoada pelos homens de boa vontade, vincou-lhe na alma a marca da geração que trabalha à sombra da Cruz de Cristo. Isto vi logo de início e à chegada. Parei no passeio publico e olhei à minha volta. Observei e conclui: Do seu ventre brota agora água a jorros, vinda de muito longe e as bichas de cântaros na Mina na Granja e no Cansado, cederam campo às condutas que, de gigantescos depósitos, levam o precioso liquido ao local de consumo.
Vi-os mais tarde no castelo. Melhoramento importante! Bendito seja quem o levou a afeito, numa ordem crescente de luta pela prosperidade da terra e bem comum. Muitas casas novas, de arquitectura moderna, já construídas, outras ainda em construção, largas avenidas e jardins, etc, identificaram-me uma data e homens que o tempo jamais pode apagar da memoria das gerações.
Tudo me era novo, estranho e encantador. Ali, na Carreirinha, tinham desaparecido as casitas baixas de outrora, dando lugar a uma espaçosa avenida em direcção à estação de Caminho de Ferro. Do solar do “Dr. Francisco” surgiu-me, como por encanto um majestoso edifício alto e bem vigorosa aparência. Além, frente ao quartel de cavalaria, no local onde fora o monumento da Grande Guerra, estava uma placa ajardinada.
Acolá, tinha desaparecido o muro duma propriedade conhecida por mim como pertença de D. Maria da Piedade Ordaz e em vez dele, outras edificações de beleza incontestável. Mais além, até a velha “capela de S. Jorge”, onde vi funcionar uma taberna, tinha desaparecido. No local nasceu outro belo edifício. Em frente ao Governo Civil, as rampas e muros transformaram-se em jardins.
Do outro lado, o muro das Finanças, onde estava ele? Nem vestígio. Tudo casas novas! Muitas casas novas. Até o quartel, tinha agora um murito em frente, muito engraçado. Que transformação total eu estava verificando, na minha velha urbe! Só a “Popular” de J. Martins Bispo & Filho conservava ainda o seu expecto de então. Observei-a com cuidado, saudoso dos tempos idos. Era domingo e as portas estavam fechadas, mas eu previ o seu interior como à 23 anos a havia deixado. Apenas o meu velho amigo tinha abandonado definitivamente o seu lugar junto da pequenita mesa que ocupava dentro da casa no interior do balcão. Ele morrera há muito, disseram-me.
Ela deveria estar lá, porque Camilo, sucessor do pai, era bastante conservador. Eu iria abraçá-lo no dia seguinte e sofrer um pouco a ausência daquele velhote inteligente e bondoso, que me havia guiado nos primeiros passos do comercio. Mal sabia eu a alegria que me esperava.... (continua no próximo número). Neste caso: no próximo “post”.
Ps. A primeira parte do artigo de José Roxo, está aqui postado, tal como foi publicado em 1951.
O Albicastrense

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