O
AMOR E A MORTE... NOS ANTIGOS REGISTOS PAROQUIAIS ALBICASTRENSES.
Por Manuel da Silva Castelo Branco
(Continuação)
Este dramático
acontecimento provocou um verdadeiro estado de tensão na vila, pois o alcaide--mor
D. António de Meneses tomou imediatamente as medidas indispensáveis param a
captura e castigo dos implicados na morte de seu filho: fecharam-se as portas
da fortaleza e cerca amuralhada; piquetes armados esquadrinhavam a terra e
arredores, em busca dos assassinos; meteram-se na prisão algumas pessoas supostas
cúmplices no atentado, entre elas os pais de Manuel da Fonseca Leitão e Simão
da Silva de Almeida (o pai e a irmã deste ficaram detidos em casa). Durante
três dias, os sinos das igrejas anunciam as cerimónias com o enterro das vítimas
e a celebração de missas por suas almas.
De Lisboa
veio logo uma numerosa alçada presidida pelo desembargador João Pinheiro, que
convoca e ouve testemunhas, entre as quais o Dr. Francisco de Luna; liberta os
julgados inocentes, como o Dr. João de Almeida e seus filhos; e acaba por
confirmar as suspeitas quanto ao envolvimento no caso da nobre família do
Fonseca Leitão. A alçada permanece bastante tempo na vila, recebendo ordenados
elevados todos os seus membros. Assim: o
juiz-presidente, Dr. João Pinheiro, vencia 4 cruzados por dia; o meirinho
Francisco do Vale e o escrivão Sebastião do Vale, 500 réis cada um, além de mais
12 homens a 100 réis e tudo à custa da fazenda dos delinquentes.
Enfim, a
sentença é pronunciada em Castelo Branco, a 14.12.1624, sendo condenados todos
os culpados não só em pesadas penas pecuniárias destinadas às famílias das
vítimas e despesas com o processo, mas também aos mais severos castigos, que
são logo executados na praça da vila e por forma simbólica, pois não se haviam
capturado os criminosos.
Assim:
Manuel da Fonseca Leitão foi degolado em estátua ao pé do pelourinho e obrigado
ao pagamento de 2000 cruzados a D. António de Meneses, 300000 réis aos irmãos
de Manuel de Matos e 200000 réis para Bernardo da Silva; Francisco da Costa de
Mendonça (seu tio, irmão da mãe) enforcado também em estátua e a igual
indemnização; João Tavares, o «Castelhano» e Francisco Mayor, o «corta-focinhos»,
enforcados depois de decepadas as mãos no pelourinho; Francisco da Proença
degradado até ao fim da vida para Angola, com baraço e pregão pelas ruas públicas;
Manuel Vaz Alfaia e António Sanches em 5 anos de degredo para o Brasil.
Quanto aos
pais e irmãos de Manuel da Fonseca Leitão, que haviam ficado presos, foram
condenados sem 8 anos de degredo para o Brasil; a nunca mais viverem em Castelo
Branco ou 10 léguas ao redor; e no pagamento de 4000, 200 e 100 cruzados, respetivamente,
para os mesmos acima nomeados.
Como os
restantes réus andavam fugidos, Antão da Fonseca teve de suportar todas as
penas pecuniárias, avaliadas em cerca de 25000 cruzados. No cumprimento da sentença
partiu para o Brasil, onde morreram sua mulher e dois filhos, ambos solteiros e
sem geração: a infeliz D. Maria de Mendonça e João da Fonseca, a quem mataram
em Pernambuco. De regresso a Portugal, viveu os últimos anos em Oledo, aqui
falecendo a 15.3.1651. Manuel da Fonseca Leitão, seu filho herdeiro, esteve
homiziado muitos anos em Castela e passando a Roma ali tomou ordens menores.
Por alvará
de 20.4.1651, EI-Rei D. João IV deu-lhe licença para voltar ao reino, falecendo
no Sabugal a 23.3.1673.
Entre finais
de 1508 e começos de 1509, desenrolara-se também na antiga fortaleza albicastrense, mais precisamente no Paço dos Comendadores e Alcaides-mores, um
outro acontecimento dramático, que vamos relatar por forma sucinta...
Era então alcaide-mor da vila D. João de Castelo Branco, 3° filho de D. Filipa de Ataíde e Nuno Vaz de Castelo Branco, vedor da azenda de D. Duarte e D. Afonso V, monteiro-mor e almirante do reino (12.4.1467), etc. Ora, não obstante a sua fama de galante poeta e esforçado cavaleiro, D. João foi muito infortunado no amor. Tinha casado com D. Leonor (filha de D. Isabel de Sousa e Afonso Vaz de Brito alcaide-mor de Souse e caçador-mor de D. Manuel I) e, havendo tomado posse de alcaidaria de Castelo Branco, (c. 1506), ali passou a residir com sua mulher e filha, nos paços da Alcáçova. Porém, D. Leonor apaixonou-se loucamente por Frei António Penalvo, seu capelão e beneficiado na igreja de Santa Maria do Castelo. Este, instigado pela amante, acometeu certa noite à traição o descuidado alcaide-mor, deixando-o estropiado e quase morto... Sobre o caso existem escassas memórias e delas apresentamos talvez a mais curiosa:
Era então alcaide-mor da vila D. João de Castelo Branco, 3° filho de D. Filipa de Ataíde e Nuno Vaz de Castelo Branco, vedor da azenda de D. Duarte e D. Afonso V, monteiro-mor e almirante do reino (12.4.1467), etc. Ora, não obstante a sua fama de galante poeta e esforçado cavaleiro, D. João foi muito infortunado no amor. Tinha casado com D. Leonor (filha de D. Isabel de Sousa e Afonso Vaz de Brito alcaide-mor de Souse e caçador-mor de D. Manuel I) e, havendo tomado posse de alcaidaria de Castelo Branco, (c. 1506), ali passou a residir com sua mulher e filha, nos paços da Alcáçova. Porém, D. Leonor apaixonou-se loucamente por Frei António Penalvo, seu capelão e beneficiado na igreja de Santa Maria do Castelo. Este, instigado pela amante, acometeu certa noite à traição o descuidado alcaide-mor, deixando-o estropiado e quase morto... Sobre o caso existem escassas memórias e delas apresentamos talvez a mais curiosa:
- D.
Leonor de Sousa, mulher do alcaide-mor D. João de Castelo Branco, fazia-lhe
adultério com um clérigo seu capelão e, para mais seguramente continuar no seu
delito, ordenou que o dito clérigo o matasse. Para este fim o meteu em sua
casa, que era no castelo da vila de Castelo Branco e, entrando D. João pela
porta já de noite, lhe deu o dito clérigo com um alfange muitas feridas,
deixando-o por morto; e, logo, para
desmentirem o delito, se pôs a dita D. Leonor e o clérigo sobre o corpo de D.
João a fazer grande pranto contra quem o matara.
Acudiu o
juiz de fora e fazendo buscar todas as pessoas, que estavam n casa, achou ao
clérigo o alfange ensanguentado pelo que, compreendendo o delito e a origem
dele, o prendeu e a D. Leonor. E dando conta a El-Rei, que estava em Évora, ele
os mandou levar àquela cidade e logo mandou degolar a dita D. Leonor e o clérigo foi degradado para S. Tomé, onde seria morto por um parente de D. João,
o qual não morreu das feridas mas ficou aleijado. Depois, correndo o tempo e
desavindo-se com D. Manuel I, lhe pediu licença para passar a Castela e El-Rei
lha deu e também para vender a alcaidaria-mor a D. Diogo de Meneses, claveiro
da Ordem de Cristo; e D. João, pondo em efeito a sua determinação, se passou àquele reino onde morreu.(19)
Uma outra
versão refere que D. Leonor de Sousa fora sentenciada « a morrer morte natural
por justiça, sem lhe valer a grandeza do nascimento nem a valia dos seus muitos
e ilustres parentes», (20) tendo sido degolada na praça de Évora, onde D.
Manuel esteve continuadamente desde Outubro de 1508 a Setembro de 1509. Quanto
a D. João sofrera profundos cutiladas numa mão, face e vista, de tal modo que
quando Duarte de Armas passou por Castelo Branco, em meados de 1509, ainda ele
se achava incapacitado para o exercício das suas funções. No entanto, acaba por
restabelecer-se e suponho que o epíteto de o «Braço de Ferro», pelo qual é designado
algumas vezes, não teria resultado apenas do seu grande valor mas talvez por utilizar
qualquer aparelho metálico destinado a corrigir esse membro afetado pela brutal
agressão do amante da mulher.
Enfim, D.
João retoma a sua atividade e, a 13.8.1513, parte de Lisboa na armada
capitaneada por D. Jaime, duque de Bragança, que vai tomar Azamor no norte de
África. De regresso ao reino (1514), D. Manuel concede-lhe a comenda dos Maninhos,
em Castelo Branco, ficando também a usufruir a tença de 10000 réis por ano com
o hábito de Cristo... O mesmo rei dá-lhe licença, em 5.6.1516, para trespassar
uma tença de 30000 réis em sua única filha D. Maria de Castelo Branco, por
virtude docasamento desta com Fernão Cabral, senhor de Azurara e alcaide-mor de
Belmonte. Mas, pouco tempo depois, vende a alcaidaria-mor de Castelo Branco a
D. Diogo de Meneses, claveiro da Ordem de Cristo e retira- -se para Castela,
onde teve brigas sobre uma dama com «El Grand Capitan», D. Gonçalo Fernandez de
Córdoba.
No «Cancioneiro Geral» de Garcia de Resende (1516), vemos uma só poesia da sua
autoria dirigida a D. Guiomar de Meneses e nela declara: «Se vos eu vira,
senhora, antes de ter o mal meu...»
(Continua)
O Albicastrense
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