quarta-feira, junho 28, 2023

ANTÓNIO ROXO - DEPOIS DO ABSOLUTISMO - (3)

(Continuação)
Em 1820 a revolução mais genuinamente democrática e liberal, que Portugal conta nos tempos modernos, tinha querido implantar no país o verdadeiro e democrático constitucionalismo política e civil, mas o povo brutificado e fanatizado por uma deprimente educação fradesca, encara à primeira vista o movimento patriótico de emancipação social com estupido indiferentismo, e mais tarde possuíra-se de terror e odio contra os vintistas. Sugestionado pelos frades, que lhe faziam crer que a revolução era obra de impios e pedreiros-livres, que só queriam destruir a religião cristã, e assassinar el-rei.Os teocratas continuavam assim a fazer frutificar a reação às ideias democráticas do marques de Pombal. Distanciando Portugal da revolução democrática da europa culta, distanciando igualmente do movimento intelectual, que fulgurava por esse mundo fora, principalmente em França “tardios e amortecidos chegaram até nós os ecos do progresso europeu; maior que a barreira dos Pireneus separava a península do resto do mundo a cordilheira alterosa do fanatismo e da ignorância. 
A política da santa aliança veio também em auxílio do direito divino que, por influxo da grande revolução francesa ameaçava ruir na Europa; e por todos estes motivos as primeiras conquistas da democracia portuguesa tiveram uma existência efémera. Aos esforços da burguesia no sentido liberal faltou o concurso do proletariado em Portugal.
A clerezia e a fidalguia, classe neófobas por conveniências próprias contrariaram, aliadas á casa reinada, todas as aspirações à liberdade. Nestes termos, como era de prever, a contra revolução tinha de ser. Não obstante a rápida regressão ao estado absolutista, o fugaz mas brilhante raio da luz liberal, apagado pelas trevas do obscurantismo, bastou para evidenciar que a grande alma Lusitânia existia pura e incorruta, como um diamante por lapidar, perdido num esterquilínio.
Os vintistas, embora alguns menos sinceros, e quiçá mais tímidos ou venais, se haverem, depois de 26, bandeado com os cartistas, constituem uma plêiade de astros de primeira grandeza, cujo brilho jamais poderá ser ofuscado pelas malquerenças absolutistas.
A Vila-Francada inutilizou a grandiosa e patriótica obra dos vintistas, derribando a constituição mais liberal e sincera de Portugal teve, e talvez terá, mas a história, serena e imparcial, já deu o seu veredito, louvando a glorificando os vencidos e deturpando e amaldiçoando os vencedores.
Com o falecimento de D. João, veio á discórdia entre a família Bragança e os irmãos D. Pedro e D. Miguel, julgando-se cada qual com direito á posse da lista civil portuguesa, atearam a guerra civil, faltando aos juramentos, que tinham prestado, esquecendo os mais elementares princípios dos deveres patrióticos e religiosos, invocando ambos o seu direito por gratia Dei.
Expolido, empobrecido, enfraquecido, completamente arruinado Portugal teve finalmente de submeter-se ao mais forte dos contendores, que por merce lhe deu uma carta de foral, sem consultar o povo, o qual aceitou a carta, ele que havia pouco ajudara a deitar abaixo uma constituição democrática.
Implantando definitivamente em Portugal o regime da carta constitucional, depois da convenção de Évora-Monte, devia seguir-se um período de sossego e de reparação, fomentador de regeneração do país; já porque desde então o partido miguelista nunca tornou a lutar á mão armada, já porque se impunha aos dirigentes a obrigação de restaurarem as forças vitais da pátria.
Não aconteceu porem assim. Uma nova época de convulsões políticas algumas ate bastante graves, teve principio, motivada pelos pseudoliberais, constitucionalistas-absolutistas, cartistas-ditadores, ambiciosos-conservadores e devoristas-indisciplinados.
A vida civil e política da nação, agitada constantemente por sucessivas revoltas, pronunciamentos e motins, em que o povo era arrastado sem consciência, servindo apenas de instrumento as ambições duns as ideias apaixonadas doutros, e ao insofrido egoísmo autoritário de todos, foi durante muito tempo, uma desordenada escola de perversão moral, social e intelectual, cujos frutos, bem amargos ainda hoje estamos tragando.
A carta de 1826 teve um vicio de origem, que sempre lhe imprimiu carácter. Ela não foi feita nem para o povo, como o fora a constituição de 22. É certo que não foi o  povo, segundo a significação genérica dada á palavra, quem fez a revolução de agosto de 29, mas foram cidadãos de origem plebeia e popular, e que tinham só a mira no alargamento das franquias e regalias populares.
(Continua)

O ALBICASTRENSE

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