quinta-feira, agosto 14, 2008

EFEMÉRIDES MUNICIPAOS – II


(Continuação)
Os trabalhos interrompidos no dia 1 de Janeiro continuaram no dia 6. Predominaram as arrematações. É interessante dar delas, pelo menos sucinta notícia, porque nos dão a conhecer os recursos de que a Câmara dispunha em 1655 e os meios de que se servia para a realização de certas obras. Uma vez conhecido, já podemos caminhar mais depressa, demorando-nos apenas com os casos mais interessantes.
Comentários sobre a acta:
Neste dia 6 de Janeiro de 1655, procedeu-se logo de entrada à a Rematação de Renda do verde nas aldeias. 
Depois das palavras sacramentais do principio do termo, sempre as mesmas, lê-se que não havendo quem milhor lanso fizese do que foi Francisco de matos que lansou em adita Renda Sento e dês mil Reis esete côvados depano verde para amenza do tabahais e hu alpendre com três colunas lavradas depedra e otelhdo reboquado de cal quanto diz da quinha de Manuel Fernandes bigodes até ocabo do poial à porta de Maria gezoina o que será feito por todo omes de marso e quatro Resmas de papel paguas logo e com das estas condisois o dito lansador foi contente e os ditos offisiais de Camera lhe mandarão arrematar o que foi satisfeito por bernardo dovale porteiro da Camera que lhe meteo oramo na mão…
Com todas estas ocisas de arrematações nunca as cautelas eram de meias, como ainda hoje o não são, e por isso foi preciso um fiador. A este respeito diz o auto:
“e logo pareseo Manuel da costa aalvarenga e dise que ele afiava as quebras emcaso que as ouvese e assim mais ao principal…”
Vê-se assim que a arrematação dos verdes nas aldeias dava para a Câmara uma parte em dinheiro e outra em obras, outra ainda em mercadorias, desde o pano verde para “ameza dos tabaliais” até as resmas de papel. 
Deve observar-se que as resmas de papel, “pagus” logo, não eram sempre pagas na espécie, antes a maior parte das vezes o eram a dinheiro. 
A seguir á arrematação da renda do verde das aldeias veio a a Remataçao do verde dalém deponsul. O melhor lanço foi o de Jurdão Fernandes que lansou na dita Renda quarenta etres mil Reis pagos aos quartéis como he costume equatro Resmas depapel paguas loguo digo as ordinárias costumadas paguas loguo com obrigasão mais de levantar mais dois palmos as paredes das ilharguas do tanque e hua delas aquerescentada mais para o meio e cobrilas ambas depedra lavrada de cantaria e assim também as asquadas depedra lavrada e as ilharguas do tanque da mesma sorte. 
Apareceu, é claro. O clássico fiador, que desta vez foi “Miguel Lourenço” que: dise que ofiava as quebras e dava fiansa acontento dos vereadores dentro emquinze dias. Vem logo outra arrematação:
É a A Remataçao da Renda do Verde deste vila.
O melhor lanço foi o de: Francisco Ruiz puxa que lansou na dita Renda sento evinte edois mil Reis paguos aos quartéis como he costume ehú pano de cochonilha com sua frania verde deseda para amenza da Camera eas ordinárias costumadas paguas logo. Serviu de fiador “Miguel Martins, que assinou Migel miz e que diz o mesmo de todos os fiadores, que dão fiansa acontento dos vereadores. 
Mas ainda não ficaram por aqui as arrematações. Houve ainda a A Remataçao da Siza dos bens derais dos montes da fregusia de Santa Maria.
O arrematante desta vez foi: Manuel frz sapateiro que lansou nela três mil e cem Reis pagos aos quartéis como he costume.
Palavra do autor: 
Espanta que tão pouco rendesse a Siza dos bens de raiz dos montes da freguesia de Santa Maria, atendendo a que esta freguesia não só abrangia a parte da cidade que ficava da rua de Santa Maria para o castelo, mas além disse, as actuais freguesias de Benquerenças e do Retaxo. Também de fracos recursos devia dispor o mestre sapateiro “Manuel frz”, que não se atrevem a pagar de uma só vez a importância da arrematação, “três mil e cem Reis”, antes fez consignar que seriam pagos aos quartéis como he costume.
No dia 6 de Janeiro ficaram por aqui as arrematações, o que não quer dizer que não houvesse ainda muitas a fazer. Havia, como oportunamente veremos que andarão muitos dias emperguão; especialmente para o pregoeiro, e por isso se tornava necessário variar os assuntos a tratar. 
Assim é que, nesta mesma sessão, depois de se darem por encerradas as arrematações, se abriu a pauta do lugar de Malpiqua, para que os bons Malpiqueiros não ficassem sem juízes, como os tinham já desde cinco dias antes outras freguesias. Por isso, a seguir ao último termo de arrematação, se lê:
Acta
Logo nadita Camera abrirão apauta do lugar de malpiqua etirarão porjuizes pedro dias guordo francisco Gonçalves epor procurador domingos alvares Rey eojuiz lhe deo juranmento dos santos avangelhos, etc.
Nas cortes de 1641, os procuradores de Castelo Branco reclamaram contra o imposto chamado “ renda das penas” por o julgarem vexatório. A reclamação não foi atendida logo nem o foi até 1655, porquanto em 9 de Janeiro desse ano foi mandado por emperguao a Renda das penas desta vila, e quem melhor lanço ofereceu foi Manuel frz samcristao.
Palavra do autor: Agora vejam até onde chegou a coragem deste sacristão nesta arrematação de renda das penas da notável vila de Castelo Branco:
Acta
Lansou na dita Renda oitenta eseis mil Reis paguos aos quartéis como he costume e hua porta feita na casa daaudiencia com sua grade deferro como a que está nacasa da Camera e outrosim cinsertar aponte docabo dos olivais caminho dealcains e hu batorel aolongo da orta na comrespondencia daponte até acabo da parede e comsertar a calsada que serão duas brasas dabanda de que da ponte oque será feito por todo ames de marso e hupano de cochonilha com sua frania verde na confirmidade da Remataçao pasada e que são oito mil Reis ou apano paguas e limpeza das Ruas como he costume.
Palavra do autor: 
Era de respeito, como se vê. O dinheiro não seria de mais, se bem que oitenta e seis mil réis em 1655 correspondiam hoje a alguns milhares de escudos; mas o reste dos encargos que assumiu o Sr. Manuel frz samcristão valia bem mais. Uma porta com grades de ferro as casas da audiência, o concerto da ponte do cabo dos olivais no caminho de Alcains, com bastorel ao longo da horta na correspondência da ponte, o concerto de duas braças de calçada para a ponte, um pano de cochonilha com sua franja verde ou oito mil réis, seu valor em dinheiro e, ainda por cinda, a limpeza das ruas, tudo isso a somado valia muito dinheiro. 
Era preciso que a renda das penas fosse coisa de importância e que o bom sacristão se não descuidasse na cobrança, que com certeza lhe não havia de valer muitas simpatias, para se sair bem da arrematação; e razões de sobra tinham os procuradores do concelho ás cortes de 1641, para pedirem a suspensão de tal imposto como vexatório. ara garantia do pagamento do imposto precisava o arrematante de fiador e este não lhe faltou. Prestou-se a isso domingos  frz  domingão que assinou o termo… de cruz. E a cruz que fez no fim do termo era de respeito em tamanho. 
Não era sensivelmente menor do que a da igreja onde o samcristão tocava os sinos, com certeza. Também não é de estranhar que assim fosse. Se o homem não era só domingos, mas era domingão, possivelmente era algum gigante. E regulava o tamanho das cruzes pelo seu corpo. “Arc”. 
(Continua)

PS - Publicado no Jornal “A Era Nova” em 1927
O Albicastrense

7 comentários:

  1. Anónimo19:45

    É fantástico. Nada como um bocado de história para afastar a polémica não é Sr. Veríssimo?
    Para quando essa reportagem sobre a desgraça dos nosos parques infantis onde oos há ecomo é que se encontram?

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  2. Caro anónimo.

    Deixe que lhe diga que não tenho o poder da multiplicação, (bem gostaria de o ter!!!) se o tivesse talvez pudesse falar aqui sobre muitos outros assuntos.
    Como deve saber… não é fácil falar do passado, pois esta tarefa obriga-me a gastar muito meu tempo livre na nossa biblioteca, ficando sem tempo muitas vezes para observar melhor o que se passa à minha volta.
    No entanto prometo dar uma volta pelos Parques infantis da nossa cidade, assim que me for possível.
    Se tiver dados sobre este tema pode deixa-los aqui, pois serviram de base para esse trabalho.

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  3. Anónimo17:12

    Caro Veríssimo
    A história é sempre um bom assunto e algumas informações que nos são extremamente utéis, mas deve conferir toda a informação quando ignora o significado do mesmo. Por exemplo, a renda do verde não incide sobre bens de raiz, mas concerne a coimas aplicadas por danos provocados pelo gado nos cultivos

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  4. Anónimo23:45

    Com este último comentário é que se vai preocupar ARC! Quem é que deve conferir o quê, tratando-se da transcrição de um artigo publicado num jornal local antigo?

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  5. 1º Caro Anónimo.

    Os dados aqui apresentados são da autoria de António Rodrigues Cardoso, (8/7/1864 - 28/1/1944) e foram publicados no jornal “A ERA NOVA”.
    O objectivo que me motivou a colocar aqui algumas das actas, que António Rodrigues Cardoso (Arc) estudou e publicou no jornal onde era director, na sua rubrica “Efemérides Municipais” é o de dar a conhecer aos albicastrenses de hoje, um trabalho que caiu no nosso esquecimento colectivo.
    Se existem erros de interpretação ou de esclarecimento dos factos, teremos que passar por cima deles, pois este trabalho de pesquisa que durou quatro longos anos!!! Deve ter tirado o sono, (muitas vezes) ao seu autor.
    Caro anónimo, vamos esquecer qualquer erro e agradecer e este grande homem, que embora não sendo albicastrense, (Nasceu na Sobreira Formosa) tomou a nossa cidade como sua, e fez por ela, mais que a grande maioria dos que aqui nasceram.
    Um abraço.

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  6. 2º Anónimo.

    Diz o segundo anónimo: Quem é que deve conferir o quê, tratando-se da transcrição de um artigo publicado num jornal local antigo?
    Caro amigo: Tratando-se de uma transcrição antiga, (com mais setenta anos). A mesma deve ser transcrita como foi publicada na referida época, (na minha modesta opinião).
    Não seria correcto da minha parte, (e mesmo que o quisesse fazer não poderia, em virtude de não possuir os conhecimentos necessários para tal).
    Fazer alterações ao trabalho de António Rodrigues Cardoso (Arc) seria da uma autêntica barbaridade da minha parte, porém nada impede que futuros investigadores o façam em trabalhos a realizar neste sector.
    Um abraço.

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  7. Anónimo11:36

    Concordo com o que diz Albicastrense.Segundo Anónimo

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