quarta-feira, agosto 03, 2016

CADERNOS DE CULTURA - "MEDICINA NA BEIRA INTERIOR". (XIX)

 A Exumação dos restos mortais do último
 Bispo de Castelo Branco
   Por Manuel da Silva Castelo Branco
(Continuação)

Assento 44
 - Aos 6 de Abril de 1831, faleceu da vida presente com todos os sacramentos e testamento o Exmo. Senhor D. Joaquim José de Miranda Coutinho, que foi Bispo desta diocese.Teve ofício e missa de presente e foi sepultado no dia 7 no cemitério, de que fiz este termo que assinei/O vigº Manuel Domingues Crespo.
Comentário
Apresentado na mitra de Castelo Branco em 3.5.1819, D. Joaquim José de Miranda Coutinho tomou posse da Diocese a 25.4.1820. No ano seguinte era eleito provedor da Misericórdia e designado deputado às Constituintes pela cidade de Castelo Branco. (49)
Aqui faleceu a 6.4.1831 (Assento 44) e foi sepultado no centro da capela do cemitério velho, em campa com as suas armas. Este cemitério, situado no flanco N. NE da Sé Catedral, havia sido edificado em 1815, quando ainda se mantinha o antiquíssimo costume do enterramento nos adros e dentro dos templos. O estabelecimento do cemitério velho resultara, particularmente, do seguinte caso.
Na noite de 19.3.1804, desabou grande parte da abóbada da igreja de S. Miguel (ou da Sé), arrastando na queda o coro da mesma, pelo que o templo foi encerrado ao culto e todas as actividades paroquiais passaram a ser executadas na igreja de Santa Isabel.
Ora, os trabalhos de restauro logo iniciados obrigaram à acumulação no adro de grande quantidade de materiais e, assim, muitos defuntos da freguesia tiveram de ser sepultados noutros locais... Por tal motivo, os procuradores do povo de Castelo Branco solicitaram a S. A.R., o Príncipe Regente (futuro rei D. João VI) a indispensável autorização para se gastarem os sobejos das sisas da cidade e seu termo na construção de um cemitério destinado à freguesia da Sé, cujas obras já tinham sido arrematadas por 6000 cruzados ao oficial de pedreiro Manuel da Silva. Alegaram também que este projeto havia sido tomado de acordo com o clero e autoridades e que obra tão útil e necessária à saúde pública não se poderia realizar apenas à custa das esmolas dos fiéis.
O Príncipe acede de bom grado e, por provisão de 8.5.1805, concede para o efeito durante 5 anos não só os sobejos das sisas mas ainda o rendimento das pastagens dos olivais baldios, sitos nos limites da cidade, ficando a Câmara Municipal encarregada de velar pelo andamento e inspeção dos respetivos trabalhos. (50)
Suponho que estes demoraram bastante ou, então, o povo não se mostrou receptivo à utilização do seu 1º cemitério público, pois, embora J. A. Porfirio da Silva (51) nos diga que fora edificado em 1815, só a partir da 2ª metade de 1819 aparece referido nos registos paroquiais de Santa Maria do Castelo e de S. Miguel da Sé.
Ao mesmo tempo, o recurso ao adro e interior dos templos continua a verificar-se, mas acaba por desaparecer definitivamente nos finais de 1823... Portanto, quando saiu o Decreto de 21.9.1835, proibindo o enterramento nas igrejas e dando origem à revolta popular da Maria da Fonte, já a urbe albicastrense seguia pacificamente e por sua determinação tal preceito, utilizando o cemitério velho.
Em 1853, o autor acima citado aponta-lhe dois grandes inconvenientes:
- Estar no centro da povoação, transmitindo-lhe com facilidade, quando batido pelos ventos de leste, os miasmas e exalações pútridas, “com grave prejuízo da saúde pública”.
- Ser de reduzidas dimensões, não dando vazão à clientela. O mesmo autor sugere também que o local mais apropriado para a instalação do novo cemitério seria a Quinta das Pedras, próximo à capela de Nossa Senhora da Piedade, mas não seguem o seu parecer.
Com efeito ele foi construído em 1860 e para lá da Fonte Nova, onde ainda se acha na atualidade. No ano de 1875 e em virtude da transferência para o novo cemitério da capela existente no antigo, pretendeu-se efetuar igualmente a exumação dos restos mortais que ali jaziam e pertencentes ao 3º bispo de Castelo Branco, D. Joaquim José de Miranda Coutinho. Tudo isto consta da Ata da respetiva cerimónia, lavrada então pelo escrivão da Câmara Francisco Domingues Guedes e a qual passamos a transcrever.
- “A 16.6.1875, no antigo cemitério situado ao lado do edifício da Sé Catedral, João dos Santos Caio vereador e servindo de presidente, António Nunes da Silva Fevereiro administrador do concelho e o Dr. Daniel Tavares da Cunha delegado de saúde do distrito (convidados pelo Presidente da Câmara Municipal, em virtude da portaria de 7.1.1875) e os R dos. Pes. Joaquim da Silva Pelejão coadjutor da freguesia da Sé e Augusto Carlos da Silva Ribeiro tesoureiro da mesma (por determinação do Vigário Geral a quem assim como ao Governador Civil, se havia comunicado o feito para procederem à exumação dos restos mortais de D. Joaquim José de Miranda Coutinho, sepultado a 7.12.1831 na capela do mesmo cemitério, pela transferência desta capela para o cemitério actual), o Presidente ordenou o levantamento da campa e a abertura da sepultura.
E, por não se encontrarem mais do que fragmentos da madeira do caixão e das vestimentas, o anel de nenhum valor quási desfeito e algum fosfato calcário, porque tudo o mais estava totalmente consumido, não praticaram os Reverendos eclesiásticos devidamente paramentados os actos religiosos correspondentes à exumação dos restos mortais do ilustre Prelado.
Não obstante, o Pe. Joaquim da Silva Pelejão mandou depositar os fragmentos das vestimentas com a matéria calcária num pequeno caixão de madeira, que foi introduzido em uma cova forrada de pedra, no mesmo cemitério e coberta com a mesma campa. (52)
Há alguns anos procurei localizar a campa armoriada do 3° Bispo de Castelo Branco, mas não obtive qualquer êxito nesse trabalho de pesquisa. 
(Continua)
O Albicastrense

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