Por Manuel da Silva Castelo Branco
(Continuação)
Epístola, entre o arco da capela absidal e a porta lateral virada
ao Poente. E, sobre ele, mandou colocar uma lápide de granito moldurada de
0,365x1,090m, com inscrição latina e escultura alusivas ao
acontecimento. O letreiro, em tradução livre de António Rodrigues
Cardoso, contém o seguinte:
- «Abdon e Sémen, que nasceram ligados, têm um só baixo ventre,
sexo e fígado; têm vidas distintas e distintas também todas as demais coisas.
Deram a vida a Deus, pois, morrendo um, o outro morreu
também, desfalecendo pouco a pouco durante sete horas. Juntos foram gerados,
juntos viveram e juntos morreram. 1716». (25)
A escultura representa duas crianças ligadas pelo abdómen, tendo a
da esquerda o braço direito entrelaçado com o braço esquerdo da criança à
direita. A capela de S. Brás foi demolida em 1940, quando restavam dela apenas algumas
paredes mestras, encontrando-se a lápide actualmente no Museu Regional de
Francisco Tavares Proença... Como já referimos, este parto prodigioso foi
divulgado não só no país como fora dele, através dos meios de comunicação usados
na época...
Assim, a «Gazeta de Lisboa» no seu n° 31 de 1.8.1716, inseria a
seguinte notícia, remetida de Castelo Branco em 18 de Julho: «Terça-feira, que
se contaram 14 do corrente, do meio dia para a uma hora,
pariu nesta vila uma mulher chamada Maria Mendes Maia, casada com António Simão
Bragança, homem jornaleiro, duas crianças pegadas uma em outra pelas cinturas,
de maneira que ambas têm um só ventre e um só umbigo e ambas se servem pelas
mesmas vias que podia ter uma só. Têm quatro pernas, mas duas alguma cousa mais
curtas que as outras. A estatura de ambas é a de uma criança pequena. Vivem espertas
e mamam bem e pelas palpitações parece
ter cada uma seu coração. A sua forma se explica melhor nesta
estampa». O epílogo do caso vai publicado no n° 33 de 15 de
Agosto do mesmo ano, sendo enviado de Castelo Branco a 1 do dito mês:
- «As duas meninas, que nasceram unidas, foram baptizadas logo em nascendo por
um homem que se achava na casa dos pais e, depois, por um clérigo «sub
conditione» sem lhes dar nome, dizendo:
«Criaturas de Deus, se não estais baptizadas Ego vos baptizo in nomine Patris,
etc.» Duraram somente vivas dezasseis dias: uma faleceu na quarta-feira desta semana
das oito para as nove horas da noite; a outra na quinta-feira pelas sete da
manhã. Fez-se anatomia nos seus corpos e não se descobriu mais novidade que a
indivisão dos intestinos igualmente continuados no seu processo, sendo a origem
diversa. Esta principiava no estômago, tendo cada uma esta oficina no seu
próprio lugar. O fígado era um só e começava no estômago de uma e se continuava
ao da outra sem divisão; os duetos para as duas vias não tinham vício algum na
sua conformação, nem o coração, bofe e peito, por se achar tudo na sua devida
conformidade». Enfim, estas informações são preciosas para esclarecer e rectificar
mesmo alguns dados já fornecidos e, além do mais, permitem-nos apreciar também
o resultado de uma autópsia feita nos começos do século XVIII. (26)
(Continua)
O ALBICASTRENSE
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