Manuel Costa Alves publicou na última edição do jornal “Reconquista”, o
artigo que pode ser lido a seguir.
Como partilhe muitas das suas preocupações sobre o nosso Barrocal, só me resta posta-lo
neste blogue e dar ao seu autor, os parabéns pelo excelente artigo.
SEMANÁRIO “RECONQUISTA / CATA-VENTOS" (13 Julho 2017)
A minha infância está a pouco mais de cem metros do
Barrocal. E ainda está à mão de semear na minha memória. A maior parte dos
leitores não saberá que o Barrocal começava muito para cá da divisória que a
linha férrea fixou. A Escola Superior de Educação está onde nos insinuávamos
por becos e quelhas e grandes pedras que faziam eco de aventuras inspiradas nos
livros de caubóis.
Convivíamos com lagartixas e grilos e pardais e cães sem
dono e ervas e árvores numa periferia que já não era aldeia mas ainda guardava
sumos de vida natural. Até hoje podemos encontrar algumas dessas pedras a
irromperem na zona como rastos de um tempo e de um espaço desaparecidos.
O lado esquerdo da avenida Nuno Álvares, de quem vai
para a Estação depois da igreja, o que era? Era Barrocal que o caminho de ferro
separou e isolou até que veio a ser explodido pelos blocos que lhe sucederam.
Imagino como o olharíamos se a cidade tivesse evoluído preservando o que, no
tempo, foi considerado um inútil amontoado de pedregulhos e hoje talvez apreciássemos
como lugar habitado por um tesouro natural.
Mas, enfim, o que lá vai, lá vai. Em causa, está agora
um projeto de intervenção do município com um orçamento que ronda um milhão de
euros. O pouco que sei dele e a pobreza dos meus conhecimentos não me autorizam
a ir além do básico senso comum.
Vejamos: a evolução da cidade determinou que fosse
arredada do convívio com esse Barrocal da minha infância que nos abria às
inocentes aprendizagens vagabundas que faziam também a nossa educação.
As crianças das gerações seguintes vão perdendo essa
relação e até as ruas lhes vêm a ficar gradualmente interditadas. Daí que
aceite como necessária e mais do que bem-vinda uma intervenção que estabeleça
uma relação de Castelo Branco com os 50 hectares do seu tão abandonado
Barrocal. Mas, cuidado!
Leio, ouço aqui e ali e sinto-me a atravessar uma
ponte entre dois fundamentalismos. O de quem acha que pode fazer o que quiser
no Barrocal e o de quem não quer que lhe mexam, nem com a flor de uma palha.
O Barrocal de Castelo Branco é um sítio de importância
geológica e ambiental, um monumento natural local com valores intrínsecos, um
espaço público que é património da cidade. Teremos de respeitar as suas
dinâmicas e não servir-nos dele com arrogâncias de antroposfera dominante.
Escreveram Carlos Neto de Carvalho e Joana Rodrigues
na sua “Proposta de Conservação e de Valorização do Barrocal de Castelo Branco”
(2010): “A valorização do Barrocal deve reunir um conjunto de intervenções que
obedeça a critérios de elevado controlo científico, gestão ambiental/
conservação da Natureza e sentido estético.”
A Câmara Municipal garante que vai ser um parque
natural. Então, tratemo-lo como tal. Um parque natural não é um parque urbano.
Muito menos um parque de diversões. Portanto, não lhe mexam muito. Mexam-lhe
apenas o necessário e com bom senso para que possamos relacionar-nos
naturalmente com ele não ferindo os seus equilíbrios. Construir infraestruturas?
Só as mínimas e, por favor,
não metalizem. Dissimulem o mais possível tudo o que fizerem, utilizem os
materiais mais leves, mais próximos ou mais familiares dos que estão lá. E não
berrem nas cores nem intervenham como se quisessem fazer cidade ali. Há sempre
um pato-bravo a querer saltar dentro de nós. Permitam que diga assim: Não criem
elefantes-brancos! Nem pistas nem auditórios! E informem e façam pedagogia
sobre o que se deve e não dever fazer no Barrocal.
Manuel Costa Alves
A Albicastrense
Perante tantas alarvidades que já li sobre a intervenção no Barrocal, (em que jogos de baixa política local sobressaem)encontro finalmente um texto repleto de bom-senso, escrito por um homem inteligente, que há muitos anos me habituei a admirar (desde os tempo da Meteorologia na RTP). Grato pela sua lúcida intervenção, caro Manuel Costa Alves. P.S. - Conheci o Barrocal nos anos 80 do séc. XX. Para mim foi uma desilusão, devido à degradação que por ali pululava. Deste protituição de rua, toxicodependentes de drogas ditas duras... a lixeira, tudo ali era degradante e repugnante. Ainda assim, como amante da literatura nos meus jovens anos, arrsquei andar por ali e percorri o barrocal, sozinho, tendo descobreto enormes belezas escondidas ao comum dos mortais. Que as mesmas sejam dadas a conhecer a albicastrenses e turistas e que se elimine a degradação que ali assisti nos remotos anos 80. Sempre, de acordo com os princípios de rigor e discrição defendidos conciensiosamente por Manuel Costa Alves.
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